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terça-feira, 6 de dezembro de 2016

O celular

E então quando eu ouvi o barulho do meu celular mergulhando na água, sério, o meu coração quase parou. Eu o peguei quase imediatamente de volta, ele pingava por todos os lados. Sequei, cuidei... Estava desligado. Medo de ligar e ele queimar de vez.
Mandaram colocar no sol. Mandaram colocar no meio do arroz seco e cru. Eu fiz tudo o que todo mundo dizia. Eu não tinha como ver as horas. Se alguém em casa precisasse de mim, não tinha nem o telefone de onde eu estava. Eu não tinha como escrever “eu te amo” a cada três horas.
O dia seguinte foi pior. Eu não pude dar bom dia e alegrar o dia dos meus amigos. Eu não sabia como estavam minhas melhores amigas. Eu não tinha os recados em tempo real do meu trabalho... Os minutos demoravam a passar, com seu avanço preguiçoso. O tempo que se impunha tinha uma coisa de cada vez, ao invés de cinco ao mesmo tempo. O tempo que se impunha. O tempo que me obrigava, me prendia ao aqui e agora.
Mandei o celular para consertar. E se nesse tempo minha amiga precisasse de uma palavra, de um abraço, ainda que virtual, de um consolo? E se o mocinho do conserto acessasse as minhas mensagens, minhas fotos, minha vida? E se copiasse as senhas e telefones dos meus contatos? Que loucura! Um medo de ter a vida assim, apartada.
Três ou quatro dias. A falta gritava menos. Ei, eu estou aqui. Não há tensão sobre esse silêncio. Nenhuma mensagem vai chegar nas próximas horas. Quando eu chegar em casa vou ligar o computador, e aquilo que pareceria extremamente urgente a três horas atrás... Simplesmente já passou.

Ontem. Celular finalmente consertado. Uma constatação: eu estava usando ele muito além do necessário.
E você? Como tem sido sua relação com o celular? 

2 comentários:

  1. Ótima pergunta!
    Tenho tentado cada vez menos. Qualidade nas relações, estar comigo mesma. Aprendizados para uma era tecnológica.
    Lindo texto!

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  2. Ótima pergunta!
    Tenho tentado cada vez menos. Qualidade nas relações, estar comigo mesma. Aprendizados para uma era tecnológica.
    Lindo texto!

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