Hoje, visitei
o ateliê de Nêgo em Nova Frigurgo (RJ). Cearense de 74 anos, foi reconhecido
pela arte entalhada em madeira. A primeira escultura do Jardim do Nego data de
1981: uma mulher negra, linda e nua. A mistura de barro e pedras tem curvas
majestosas e insinuantes e é coberta por um aveludado musgo. Inspiradora...
Nêgo viveu 12
anos em reclusão e, nesse período, passou por fome, reconstrução e epifania. De
seu passado, ouve-se ecos de um roubo sem provas, um hippie de violão, um filho
reaproximado e mulheres, muitas mulheres. Suas esculturas confirmam as histórias
e voltam os olhos da nova Suíça para a beleza e a fome de um Ceará agreste.
A
grandeza da arte de Nêgo ultrapassa o tamanho de suas esculturas. O corpo
feminino ora exala sensualidade, ora flana ébrio, ora pare contorcido. A
criança ausente na vida é gigante e meiga escultura. Autorretratos do artista
espalham-se nos rostos de homens e mulheres de barro que erguem mãos e olhos
para os céus.
Nêgo
declama a liberdade do corpo etéreo. O artista explica que energia universal
atravessa o ser humano e o move para suas realizações. Seu chacra da terceira
visão protegido e o recente estado celibatário são suas formas de concentrar energia libidinal no
plexo solar. O corpo capta e abriga essa energia e ela retorna ao universo ao
perecermos. Instigante filosofia.
Quando
vi os olhos vazados das esculturas, por um momento pensei: são cascas ocas. Após
construir suas estátuas gigantes de barro, Nêgo precisa regá-las duas a três
vezes e cobri-las com uma lona. Este processo favorece o crescimento de uma
macia superfície de musgo que as protege. Sem isso, a obras ficam ressecadas e
se quebram.
A
vida artística de Nêgo é a metáfora de sua filosofia. As mãos do grande criador
mantêm viva a sua obra. Trabalho paciente e persistente que garante a integridade
de suas esculturas há 35 anos, mais de metade se sua existência.
Após 12 anos
de exílio e privação, Nêgo investe em seu Jardim. Obras destruídas pela tragédia
friburguense de 2011 foram reformadas e outras construídas. O Jardim do Nêgo
tem sua infraestrutura melhorada tendo em vista turistas, admiradores e
investidores.
A casa do escultor
é ampliada, para aconchegar um Deus que precisa dedicar sua vida pela criação.
Por uma epifania, ele já sabe disso, resigna-se com tudo. Talvez, essa seja a vida até
sua morte: um possível Enterro
prematuro de Poe.
Cris Couto, 12/07/2016
Sou Cris Couto:
mulher, negra mãe e escritora.
Publico no
blog Flor do Dia: Coletivo do Bonde às quartas-feiras
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outros textos meus em:
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Que lindeza!!!! Que lindeza!!!
ResponderExcluirObra e vida se confundem neste majestoso jardim!
ResponderExcluirMaravilhoso conhecer essa obra por meio dos seus olhos.
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